Língua
Portuguesa – Leitura e Interpretação de Texto 8ºano
CENA URBANA (Adaptação de
uma crônica de Carlos Drummond de Andrade)
Quando a senhora foi descer do
lotação, o motorista coçou a cabeça:
- Cem reais? Como é que a senhora
quer que eu troque cem reais?
- Desculpe, me esqueci completamente
de trazer trocado.
- Não posso não, a madame não leu o
aviso – olha ele ali- que o troco é de dez reais?
- Eu sei, mas que é que hei de fazer agora? O senhor nunca
esqueceu nada na vida?
- Quem sabe se procurando de novo na
bolsa...
- Já procurei.
- Procura outra vez.
Ela vasculhava,remexia,nada.Nenhum
cavalheiro (como se dizia no tempo do meu avô) se moveu para salvar a situação,
oferecendo troco ou se prontificando a pagar a passagem.Àquela hora, não
havia cavalheiros, pelo menos no lotação.
- Então o senhor me dá licença de
saltar e ficar devendo.
- Espere aí! Vou ver se posso
trocar.
Podia. Tirou do bolso de trás um
bolo respeitável e foi botando as cédulas sobre o joelho, meticulosamente.
- Está aqui o troco. De outra vez a
madame já sabe, hein?
Ela desceu, o carro já havia
começado a chispar, como é destino dos lotações, quando de repente o
motorista freou e botou as mãos à cabeça:
- A azulzinha! Ela ficou com a
azulzinha!
Voltando-se para os passageiros:
- Os senhores acreditam que em vez
de guardar a nota de cem, eu de burro, devolvi com o troco?
Botou a cabeça fora do carro, à
procura da senhora, que atravessava a rua, lá atrás:
- Dona,Ó dona! A nota de cem reais!
Ela não escutava. Ele fazia sinais,
pedia aos transeuntes que a chamassem, o trânsito entupegaitava-se,
buzinas soavam.
- Toca! Toca!
Os passageiros não pareciam
interessados no prejuízo, como antes não se condoeram do vexame da
senhora.
- Como é que eu posso tocar, se
perdi cem reais, gente? Quem vai me pagar esses cem reais?
Encostou o veículo, e, num gesto
solene:
- Vou buscar meu dinheiro. A partir
deste momento, confio este carro, com todos os seus pertencentes, à distinção
dos senhores passageiros..
- Deixa que eu vou – disse um deles,
um garoto. E precipitou-se para fora, antes do motorista.
- Será que este tiquinho de gente
consegue?
Via-se o garoto correndo para
alcançar a senhora, tocando-a pelo braço, os dois confabulando. Ela
abria de novo a bolsa, tirava objetos, o pequeno ajudava. Enquanto isso, o
motorista queixava-se:
- Esta linha é de morte. Primeiro
querem que a gente troque cem reais, como se o papai fosse o Banco Central ou o
Banco do Brasil. Depois carregam o troco e o dinheiro trocado, que nem juros.
Essa não! E esse garoto que não acaba com a conversa mole, sei lá até se ele
volta.
Os passageiros impacientavam-se com
a demora da expedição. O guarda veio estranhar o estacionamento e recebeu a
explicação de força-maior, quem é que me paga cem reais? A Companhia de
Trânsito?
O garoto voltou sem a nota. A
senhora tinha apenas 97 reais, ele vira e jurava por ela.
- Toca! Toca!
- Estão vendo? Um prejuízo desses
antes do almoço é de tirar a fome e a vontade de comer.
Disse isso, em tom frio, sem
revolta, como simples remate. E tocou. Perto do colégio, o garoto desceu,
repetindo, encabulado:
- Pode acreditar, ela não tinha
mesmo o dinheiro não.
O motorista respondeu-lhe baixinho:
- Eu sei. Já vi que está ali debaixo
da caixa de fósforo. Mas se eu dissesse isso, esse povo me matava.
VOCABULÁRIO
Chispar:
sair em disparada, sair apressadamente.
Condoer-se:
ter dó, compadecer-se
Confabular:
conversar, tagarelar.
Desembestar:
correr, partir apressadamente.
Entupigaifar:
congestionar.
Meticulosamente:
cuidadosamente, cautelosamente, detalhadamente.
Prontificar:
aprontar, oferecer, mostrar-se disposto a.
Transeunte:
pedestre.
Vasculhar:
procurar, pesquisar meticulosamente.
Agora
Responda:
1-
Sentindo-se sem razão, diante do motorista, que lhe mostrava o aviso, a
senhora:
a)
Desculpou-se humildemente; b) ofendeu-se grosseiramente;
c) penitenciou-se publicamente; d) mostrou que a
falibilidade é humana; e) envergonhou-se.
2- Não aceitando a solução que a senhora propusera para o
impasse do troco, o motorista deu um exemplo de: a) solidariedade; b)
imprevidência; c) compreensão; d)intolerância;e)falta de educação.
3- Neologismo é uma palavra nova, criada pelo povo ou
pelos escritores. O brasileirismo ENTUPIGAIFAR, usado por Drummond, sugere-nos
no texto as idéias de:a)confusão e barulho; b)silêncio e suavidade; c)revolta e
desespero; d)amizade e diplomacia; e) prejuízo e vergonha.
4- Que verbo traduz o destino dos lotações? a)
tergiversar; b) fustigar; c)desembestar;
5- Em certa parte do texto você sentiu que:
a) Os
motoristas de lotação mostram-se sempre compreensivos com os problemas alheios.
b)
os motoristas de lotação são sempre atentos no que se refere ao dinheiro.
c) a
vagarosidade é uma característica dos transportes coletivos.
d) a
cortesia, a delicadeza, a gentileza estão desaparecendo em nossos tempos.
e) a
confiança é a tônica do relacionamento de seres humanos.
6-
Quais os três pronomes de tratamento que o motorista empregou, referindo-se à
passageira sem troco?
____________________________________________________________________________.
7-
Quando o motorista coçou a cabeça, revelou:
a) Desespero;
b) tranqüilidade; c) preocupação; d) contentamento; e) gratidão.
8-
Há outros movimentos físicos que traduzem estados de espírito.Associe-os:
( ) juntar as mãos em prece (1) despreocupação
( ) torcer o nariz (2) desprezo
( ) franzir a testa (3) súplica
( ) alçar os ombros (4) preocupação
9-
Ainda há outros movimentos físicos que traduzem estados de espírito.Associe-os:
( ) ranger os dentes (1) fúria
contida
( ) arregalar os lhos (2) surpresa
( ) morder os lábios (3) desespero
( ) botar as mãos na cabeça (4) raiva
10-
Pelo final da crônica percebemos que o motorista:
a) Entrou
pelo cano; b) meteu a viola no saco; c) deu com os burros n’água; d) ficou com
a pulga atrás da orelha; e) não deu o braço a torcer.
11-
O encabulamento do garoto deveu-se:
a)
ao fracasso de sua missão; b) à teimosia do motorista; c) à impaciência dos
passageiros; d) à intransigência do guarda de trânsito; e) à arrogância da
passageira.
12-
O motivo de força maior alegado foi:
a) a
demora do garoto; b)o prejuízo do motorista; c)o nervosismo dos passageiros;
d)a falta de troco; e)a estranheza do guarda.
13-
Em relação ao prejuízo do motorista e ao vexame da senhora, os passageiros
mostraram-se:
a)intranqüilos;
b)preocupados; c)atenciosos;d) frios; e) aborrecidos.
14-
Para o motorista, o Banco Central e o Banco do Brasil simbolizam:
a)eterna
vigilância; b) honestidade no trato com o dinheiro alheio; c)poderio econômico;
d)capacidade administrativa; e)confiança humana.
15-
Na oração:”Confio este carro à distinção dos senhores passageiros”,
classifica-se o predicado como_________ e o verbo_________.
16-
Na oração:”Esta linha é de morte”, classifica-se o predicado como________ e o
verbo_________.
17-
Na oração:”Àquela hora, não havia cavalheiros, pelo menos no lotação”, o
sujeito é____________________________ porque____________________.
18-
Na oração:”Esse tiquinho de gente consegue?” o predicado é classificado
como_________________ e o verbo______________.
19-
No termo em destaque “Tirou do bolso de trás um bolo respeitável” passe-o para
a voz passiva.
___________________________________________________________________________.
20-
Faça a análise sintática do termo “Os passageiros não pareciam interessados no
prejuízo”.
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________.
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